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SANTA CATARINA – Pela perspectiva dos filhos: grupo do MPSC fomenta a reflexão de pais e mães em situações de conflito

“Jogar fora o orgulho, pensar mais nos filhos: eis a grande questão”. Com letras miúdas e espaçadas, o participante escreve sua constatação ao final de um encontro do Grupo de Apoio e Reflexão (GAR) do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC). A frase representa a intenção do projeto: auxiliar pais e mães em processo de separação e em conflito pela guarda das crianças a refletirem pela perspectiva dos filhos. A iniciativa, até então realizada somente na 21ª Promotoria de Justiça da Capital, conta agora com projeto para expansão e implementação em outras PJs. 

A transformação na forma de olhar para os filhos e de perceber seu papel como pais e mães foi sentida por todos os participantes de 2019 do GAR que responderam ao formulário sobre os encontros. “O projeto procura promover a autorresponsabilidade, mostrando formas de lidar com o conflito do fim da conjugalidade para que não confundam isso com o fim da parentalidade. Apesar de ex-cônjuges, serão pais e mães por toda a vida”, considera o Promotor de Justiça Leonardo Henrique Marques Lehmann, da 21ª PJ da Capital. 

Os integrantes, pais e mães envolvidos em conflitos relacionados a processos em trâmite na Vara de Família são direcionados ao GAR por ordem judicial. O juiz pode determinar a participação em 6 a 10 encontros, a depender da complexidade da situação. Ano passado, foram 36 participantes ao todo e 35 encontros entre março e dezembro. São constituídos dois grupos simultâneos, para que os envolvidos diretamente no mesmo conflito possam participar de maneira separada, mas num mesmo período. 

Iniciativa de uma assistente social do MPSC, Benimari Moreira, há 13 anos o projeto é realizado na  PJ da Capital. A partir dessa experiência e da institucionalização do GAR por meio do ato que implementou no MPSC o Programa de Incentivo à Autocomposição Familiar (PIAF), em 2017, estruturou-se um projeto para que o grupo pudesse ser ampliado. “Hoje, já temos essa expertise e estamos finalizando o documento que indicará um passo a passo para sua replicação. Estamos divulgando a iniciativa sempre que possível e temos recebido contato de outras Promotorias de Justiça interessadas em implementar o GAR”, afirma o Coordenador do Centro de Apoio da Infância e Juventude (CIJ), Promotor de Justiça João Luiz de Carvalho Botega. 

As PJs interessadas em implementar o GAR poderão entrar em contato pelo e-mail do Núcleo de Incentivo à Autocomposição (NUPIA) do MPSC: nupia@mpsc.mp.br.

Agentes da transformação

Os encontros do GAR baseiam-se num conjunto de metodologias inspiradas nos Círculos de Construção de Paz, na comunicação não violenta e em conceitos de Justiça Restaurativa. O roteiro das atividades é planejado pelos facilitadores – servidores ou membros do MPSC que se voluntariam e são capacitados na área – e abordam temáticas como autorresponsabilidade e gestão de conflitos. São realizadas também dinâmicas em grupo e exercícios lúdicos, a fim de trazer a reflexão com encontros leves. 

Há dois anos atuando como facilitadora, a chefe do Setor de Atendimento ao Cidadão do MPSC, Kátia de Jesus Wermelinger, acompanha o grupo com sentimento de satisfação. “Fico muito feliz por participar desse trabalho. Quando os participantes encontram outras pessoas passando pelas mesmas experiências, se sentem seguros para se abrirem uns com os outros e com os facilitadores e acabam identificando estratégias para melhorar as relações e transformar o conflito”. 

Por serem judicialmente encaminhados à participação no GAR, a facilitadora Roberta D’Avila, servidora da Coordenadoria de Operações Administrativas (COAD), observa que alguns participantes ficam relutantes no início. Conduzi-los a uma nova perspectiva trabalhando temáticas que tragam ao olhar dos adultos a visão das crianças é tarefa “desafiadora, mas também muito gratificante”. Tão gratificante que a servidora do CIJ Luciana Andrea Mattos, atuante há mais de três anos no grupo, relata que, “mesmo de férias, a gente sente vontade de estar nos encontros”.

Os resultados desses esforços evidenciam-se em depoimentos como “tenho saído com vontade de voltar” e “elogio a visão e a condução dos facilitadores, são realmente dez”, relatados pelos integrantes nos formulários de avaliação aplicados ao longo do segundo semestre de 2019 sobre sua participação no GAR. Todos demonstraram ter compreendido o objetivo do grupo ao final da sua participação. O índice mais importante revelou que, ao término dos encontros, 62,5% dos participantes se sentia ótimo e os outros 37,5% se sentia bem.  

Para o Promotor de Justiça Leonardo Henrique Marques Lehmann, essa mudança se reflete “na própria transformação do comportamento dos envolvidos e numa maior facilidade de chegar à composição, que é a melhor resolução em casos de família. Quando há imposição, muitas coisas não funcionam; compreensão e paciência não podem ser impostos”. Sem o GAR, Lehmann considera que os processos se resolvem ao seu tempo, e, muitas vezes, a vida e os conflitos também. Muitas vezes, não. “Se isso não é resolvido de uma forma efetiva, as crianças e adolescentes envolvidas na situação terão suas vidas marcadas por esse conflito”, comenta o Promotor de Justiça. Cerca de 25 crianças foram indiretamente atendidas com a atividade do GAR de 2019. 

Ampliando o escopo

Quando avaliaram o desempenho dos facilitadores, a nota máxima foi escolhida por todos os respondentes. Ter condutores bem capacitados e em constante aprimoramento é um dos principais elementos para a expansão do projeto, considera o Coordenador do CIJ, Promotor de Justiça João Luiz de Carvalho Botega. Botega, que é também Coordenador Operacional do NUPIA, núcleo que tem entre suas atribuições o auxílio na promoção de capacitações, afirma que este ano será realizado curso para facilitadores de grupo. 

 “O desafio é encontrar servidores que desejem atuar e se capacitar para o grupo. No GAR atual, são servidores do próprio MPSC que realizam os encontros, mas quando isso não for possível podemos buscar parcerias com outros órgãos, como os Municípios e o próprio Judiciário. O treinamento dependerá do perfil da pessoa, se já tem afinidade com a área e só irá se especializar quanto à metodologia do GAR, ou se precisa ser introduzida também a uma parte mais teórica”, considera Botega. 

Além disso, 2020 é ano de expansão de atividades também para os novos grupos da 21ª PJ da Capital. O relatório de atividades de 2019 foi o primeiro a ser produzido e, agora, há também a intenção de acompanhar os casos judiciais dos participantes a fim de levantar indicadores que poderão verificar, nesse âmbito, a eficácia da iniciativa. O Coordenador do CIJ, entretanto, faz uma ressalva: “Mais importante é verificar a mudança de perspectiva dos pais, para que consigam ressignificar sua situação afetiva e emocional visando à proteção da criança”. E os indícios disso, ele ressalta, podem ser notados nos depoimentos de transformação dos participantes. 

Resgate do significado da palavra “família” na separação dos pais

“Pais separados continuam pais e mães separadas continuam mães para o resto da vida”: com essa frase, o Promotor de Justiça Leonardo Henrique Marques Lehmann define bem o entendimento que norteia o Grupo de Apoio e Reflexão (GAR), que funciona na 21ª Promotoria de Justiça, localizada no Fórum do bairro Estreito, em Florianópolis.

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