Palestra do Procurador Nacional Antimáfia da Itália encerra Simpósio internacional no MPRJ
O Simpósio Internacional Combate à Criminalidade Organizada – Diálogos Entre Brasil e Itália foi encerrado com a palestra do Procurador Nacional Antimáfia da Itália, Pietro Grasso, que relatou as experiências de combate à Cosa Nostra e aos grandes chefes da máfia italiana. “Quando se fala em criminalidade organizada, pensa-se imediatamente em máfia, que é talvez a palavra italiana mais conhecida em todo o mundo”, disse Grasso ao iniciar sua palestra na tarde de sexta-feira (29/06).
O Subprocurador-Geral de Justiça de Atribuição Originária Institucional e Judicial, Antonio José Campos Moreira, deu início às palestras pela manhã, destacando a atuação e o excelente trabalho da Coordenadora do Centro de Estudos Jurídicos (CEJUR), Procuradora de Justiça Maria Cristina Palhares dos Anjos Tellechea; do Coordenador do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), Promotor de Justiça Cláudio Varela; e do Presidente da Fundação Escola Superior do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (FEMPERJ), Promotor de Justiça Leonardo Araujo Marques.
Após a abertura, o ex-Deputado italiano e ex-Presidente da Comissão Parlamentar Antimáfia, entre 2006 e 2008, Francesco Forgione falou sobre a internacionalização da máfia. Professor de História e Sociologia das Organizações Criminosas na Università degli Studi di l’Aquila, Forgione afirmou que as máfias são fenômenos de atraso da sociedade. “São obstáculos ao desenvolvimento econômico e social de um país”.
Durante a palestra, Forgione mostrou como a venda de cocaína é lucrativa para a máfia. “A coca preparada pelos camponeses é vendida por 1 mil, 1.200 euros o quilo, passa pelos narcotraficantes a 10mil, 15 mil euros o quilo, depois pelos calabreses, elevando para 30 mil euros o quilo, e chega ao mercado, onde o quilo de coca pura é misturada, se transformando em quatro quilos. E cada quilo é vendido por 50 mil euros, ou seja, no fim, o faturamento chega a 200 mil euros. Não há mercadoria no mundo que tenha um crescimento, uma valorização como a coca”.
Em seguida, o Promotor de Justiça do GAECO de São Paulo Flávio Okamoto focou a atuação do MP paulista contra o crime organizado dentro do sistema prisional e as investigações para controle das ações da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC).
Antes de passar a palavra para o Delegado Claudio Ferraz, ex-titular da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (DRACO), o Subprocurador Antonio José lembrou a parceria de sucesso realizada entre a Draco e o MP, por intermédio do GAECO. “De uma forma inédita, tivemos a oportunidade de trabalhar em conjunto com a DRACO. Embora seja uma relação institucional, a parceria se apoiou prioritariamente no principio básico da confiança”, disse Antonio José.
Ferraz afirmou que trabalho integrado é imprescindível para a efetividade do enfrentamento às organizações criminosas. O Delegado falou sobre a sua experiência à frente da DRACO no combate às milícias no Rio de Janeiro e destacou as estratégias, que acarretaram, inclusive, a prisão de políticos e policiais envolvidos com a criminalidade. “Procuramos garantir que as prisões fossem preventivas, e tentamos evitar, ao máximo, prisões temporárias, que foram formas de impedir a prática da intimidação de testemunhas e também que eles interferissem nas investigações”, contou Ferraz.
Apesar de não se ter atualmente um conceito definido sobre criminalidade organizada, o Delegado falou sobre características que se repetem nesses grupos, como se aproveitar da fragilidade de pessoas que vivem em áreas carentes, uso de métodos cruéis de intimidação e, o principal, a busca pelo lucro. “Eles se aproveitam da pobreza para alcançar a riqueza. Não se enganem: crime é um negócio e objetivo de todo negócio, seja lícito ou ilícito, é lucro. Além disso, eles buscam apoio político, através da cooptação ou da intimidação. A terceira fase é a eliminação. Eles criam mecanismos de cooptação, com corrupção de profissionais, por exemplo. Agora para cada abordagem há um antídoto, e o profissional que vai combater isso tem que saber, ele tem que criar mecanismos para enfrentar o crime organizado”, alertou Ferraz.
O Coordenador do GAECO/RJ, Cláudio Varela, destacou a parceria do MPRJ com as Polícias Federal, Civil e Militar. “Não se pode pensar em combate ao crime organizado sem o estabelecimento de parcerias. E, neste ponto, Flávio Okamoto e Claudio Ferraz foram de extrema importância para o GAECO/RJ no cenário nacional e estadual”, afirmou.
O Promotor de Justiça Alexander Araújo de Souza exortou peculiaridade do MP brasileiro e ressaltou que é necessário aproveitar essa característica a favor da sociedade e no combate aos criminosos. “Não é só o Promotor criminal, o Promotor de investigação penal, que pode combater a criminalidade organizada. Ela não é um fenômeno somente criminal, é sobretudo criminal, mas não é só isso. Ela é um fenômeno político, econômico, social e histórico. E nós, como órgão de transformação social, temos que combatê-la com todos os instrumentos que temos”, disse o Promotor, que ao final da palestra fez uma homenagem à Juíza Patricia Acioli, assassinada em São Gonçalo.
A palestra de Pietro Grasso encerrou o encontro sob o tema os instrumentos jurídicos para o combate ao crime organizado na Itália. O Procurador italiano falou que não se pode encarar as organizações criminosas como “um animal misterioso”, como algo que não tem fim. “A máfia é composta de homens, que acumulam dinheiro e poder. Esses homens estabelecem relações com a economia, com a sociedade e com políticos. É preciso destruir essa cadeia, interromper o tráfico, destruir os vínculos dessas organizações”, afimou Grasso.
O Procurador abordou as características mais importantes da atuação das autoridades italianas que desmantelaram as máfias do país, como sequestro de patrimônio, escutas telefônicas, completo isolamento dos que eram presos. A atuação cruel desse grupo foi relatada durante a explanação, como a emboscada que causou a morte de Giovanni Falcone, antecessor de Pietro. Em retaliação aos que ousavam enfrentá-los, a organização criminosa chegou a executar Magistrados, jornalistas, empresários, civis e até crianças. Toda essa brutalidade, conta Grasso, gerou revolta na sociedade italiana que passou a se manifestar, atitude que antes não acontecia.
De acordo com Grasso, a maneira mais eficaz de se enfraquecer a máfia é atacar seu patrimônio, o que não é tarefa fácil já que a prática da lavagem de dinheiro e os paraísos fiscais, pouco combatidos pela comunidade internacional, são dois artifícios utilizados para esconder o rastro do dinheiro ilegal. Para ele, a instituição dos réus colaboradores, mais conhecida no Brasil como delação premiada, permitiu às autoridades conhecerem a estrutura e a hierarquia da máfia. Grasso citou a prisão, realizada pela Polícia Federal brasileira, de um mafioso da Cosa Nostra que acabou se tornando um réu colaborador.
Ao fim do evento, Pietro Grasso prestou uma homenagem ao Magistrado Giovanni Falcone, com quem atuou no maxiprocesso contra a máfia siciliana e na criação da Procuradoria Nacional Antimáfia. Foram exibidas imagens do atentado que matou o juiz e sua esposa, também Magistrada, e da prisão, em 2006, de Bernardo Provenzano, chefe da Cosa Nostra. “Falcone nos deu um patrimônio moral de equilíbrio, coragem, humanidade e profissionalismo. Seu exemplo nos transmite a obrigação moral de buscar a Justiça até o último sopro de nossas vidas”, disse Grasso em seu discurso.
Simpósio internacional: oficinas de trabalho analisam estratégias no combate ao crime organizado
As oficinas de trabalho que integraram a programação do “Simpósio Internacional de Combate à Criminalidade Organizada – Diálogos Brasil e Itália” foram encerradas nesta quinta-feira (28/06) com palestras reunindo Membros do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO) dos Estado do Rio de Janeiro e de São Paulo e da Coordenação do 8º Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Execução Penal. O encontro será encerrado nesta sexta-feira (29/06) com a participação do Procurador Nacional Antimáfia da Itália, Pietro Grasso, entre outros convidados, no auditório do edifício-sede do MPRJ.
O último dia de oficinas foi aberto pelo Subprocurador-Geral de Justiça de Atribuição Originária e Institucional Antonio José Campos Moreira. Voltadas exclusivamente para os Membros inscritos, as oficinas de trabalho buscaram mostrar as dificuldades e desafios práticos enfrentados pelos Promotores de Justiça no combate ao crime organizado. “O diferencial destes encontros foi mostrar nuances e estratégias do trabalho ministerial e transmitir experiências, habilidades e técnicas de investigação que podem auxiliar o trabalho do dia a dia do Promotor de Justiça da área de persecução penal”, explicou o Assistente do Centro de Estudos Jurídicos (CEJUR), Promotor de Justiça Arthur Machado Pauperio Neto.
Dentre os palestrantes do GAECO-RJ estavam os Promotores de Justiça Décio Alonso Gomes, Fabio Miguel de Oliveira e Angélica Mothé Glioche Gaspari. Foram apresentados recursos usados em investigações que desencadearam grandes operações no Estado, entre eles, o estabelecimento de uma rede de apoios e relacionamentos, o cruzamento de dados, o uso interceptações telefônicas, técnicas de infiltração, entre outras.
Já a Coordenadora do 8º CAOp, Andrezza Duarte Cançado, explicou a gênese e o funcionamento do Regime Disciplinar Diferenciado e a legislação sobre transferência de presos para presídios federais, com análises de casos. O Promotor de Justiça Flávio Okamoto, do GAECO-SP, focou a atuação do MP paulista contra o crime organizado dentro do sistema prisional e as investigações para controle das ações do Primeiro Comando da Capital. Ao todo, foram três dias de debates e análises de estratégias para o combate das organizações criminosas.
Okamoto voltará a palestrar nesta sexta, durante o encerramento do evento. Ele vai abordar o combate do MPSP contra o PCC em todo o Estado, a partir das 10h30. Ele será antecedido pelo professor de História e Sociologia das Organizações Criminosas e Presidente da Comissão Parlamentar Antimáfia entre 2006 e 2008, Francesco Forgione, que vai abordar a internacionalização da máfia. À tarde, o Delegado de Polícia Claudio Ferraz (ex-DRACO) abordará a atuação policial contra o crime organizado. Já o Promotor de Justiça Alexandre Araujo de Souza mostrará os instrumentos jurídicos disponíveis para esse enfrentamento. O encerramento do evento será feito pelo Procurador Nacional Antimáfia da Itália, Pietro Grasso.
Fonte: ASCOM / MPRJ