SANTA CATARINA – MPSC na defesa dos direitos da população em situação de rua
No dia 19 de agosto de 2004, sete pessoas em situação de rua foram mortas e oito ficaram gravemente feridas após uma série de atentados violentos na Praça da Sé, em São Paulo. O episódio passou a ser um marco para essa população e a data ficou conhecida como o Dia Nacional de Luta da População em Situação de Rua – um dia que também serve de oportunidade para chamar a atenção para os direitos desse grupo social.
Antes de tudo, a fim de não reproduzir preconceitos que geram invisibilidade social, é preciso compreender que as pessoas em situação de rua são titulares de direitos e têm histórias de vida singulares. Esses indivíduos possuem garantias constitucionais, como o direito de ir e vir, de uma vida digna e de acesso às diferentes políticas públicas. Os fatores que os levaram a essa condição são os mais diversos: histórias de vida ou contexto sociocultural, questões de saúde ou fragilização de vínculos familiares, situações adversas decorrentes de desastres ambientais, assim como questões econômicas, desemprego e ausência de condições de prover uma habitação.
O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) atua na defesa dos direitos e da cidadania dessa população. Combater o preconceito e a discriminação para proteger os cidadãos é uma das atribuições do Promotor de Justiça nessa área. “A vulnerabilidade social das pessoas em situação de rua deve ser trabalhada por meio de um processo estrutural, em que o Ministério Público, além de fiscalizar ações, auxilie na busca da solução mais adequada ao caso, de modo a garantir que a política pública atenda a seu fim”, afirma a Promotora de Justiça Lia Nara Dalmutt.
Direitos garantidos
Instituída cinco anos após o acontecimento na Praça da Sé, a Política Nacional para a População em Situação de Rua prevê uma rede de atenção a essa população, composta de diferentes sujeitos governamentais e não governamentais, em todos os níveis federativos, para articulação entre as diversas áreas de atendimento.
Já no Sistema Único de Assistência Social, instituído pela Política Nacional de Assistência Social (PNAS/2004), são tipificados os serviços socioassistenciais específicos para esse grupo, no nível de proteção social especial de média e alta complexidade, ou no âmbito dos Centros de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS).
Na média complexidade, pode ser executado o Serviço Especializado de Abordagem Social com a finalidade de busca ativa e de inserção desses indivíduos na rede de serviços socioassistenciais e das demais políticas públicas na perspectiva da garantia dos direitos. Há, ainda, o Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro-POP) com o Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua, que age para assegurar atendimento e atividades direcionadas ao desenvolvimento de sociabilidades, na perspectiva de fortalecimento de vínculos interpessoais.
Na alta complexidade, constam o Serviço de Acolhimento Institucional, destinado a famílias ou indivíduos com vínculos familiares rompidos ou fragilizados, e o Serviço de Acolhimento em República, que oferece moradia subsidiada a adultos em situação de vulnerabilidade e risco pessoal e social, com vínculos familiares rompidos ou extremamente fragilizados e sem condições de moradia e autossustentação.
Além disso, a pessoa em situação de rua pode figurar nos serviços de Proteção Social Básica, executados no Centro de Referência em Assistência Social (CRAS).
Na área da saúde, essa população também pode ser atendida por um consultório na rua, constituído por equipes multiprofissionais da área de saúde que fazem atendimento fixo ou móvel.
Dado o contexto de pandemia, impõe-se também a necessidade de ações emergenciais como locais de acolhimento de acordo com as normas sanitárias, o fortalecimento do acesso aos serviços públicos e medidas de mitigação de contágio com acesso a informações e atendimento, quando necessário.
QUEM SÃO AS PESSOAS EM SITUAÇÃO DE RUA?
Não há dados oficiais sobre a população em situação de rua no Brasil, apenas estimativas. O levantamento mais recente foi feito em 2016 pelo Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), que estimou em 101.854 o número de pessoas nessa situação.
De acordo com a Política Nacional para a População em Situação de Rua, instituída pelo Decreto n. 7.053/009, trata-se de um “grupo populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular”. São, assim, pessoas com diversas interseccionalidades, de gênero, raça/etnia, geracional e de procedência regional.
É equivocado, portanto, dizer que são “moradores de rua”, tendo em vista que o locus rua não pode ser considerado uma moradia, já que não apresenta minimamente as condições encontradas em uma habitação, como as de conforto térmico e segurança. A própria denominação “rua” e as afirmações de que a vida em tais condições é uma “escolha” trazem as marcas da exclusão e do estigma a que essas pessoas estão comumente submetidas