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SANTA CATARINA – MPSC promove campanha “Bullying não é brincadeira”

“Eu só queria morrer e que as pessoas que me faziam sentir assim também morressem”, conta Renata*, de 22 anos, vítima de bullying na adolescência e que hoje carrega muitas lembranças e cicatrizes físicas de “uma das piores fases” de sua vida.

Com Lígia*, de 20 anos, a história não foi diferente. “Depois que começaram a rir de mim, eu passei a ficar depressiva, comia muito e engordei bastante. Eles me batiam, me empurravam do balanço e uma vez fui até mesmo chutada na costela. Na sexta série eu desenvolvi bulimia nervosa.”

Ao conversar com crianças, adolescentes e adultos, as histórias de agressão se repetem. Assim é com o objetivo de prevenir e combater o bullying e evitar que outras pessoas também sofram, que o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) incentiva o diálogo e o esclarecimento sobre esse fenômeno, através de campanhas e orientações diversas, com ênfase na cultura do respeito e no combate aos preconceitos.

A campanha “Bullying: isso não é brincadeira” é uma forma de comunicar e esclarecer o assunto. Vídeos informativos e educativos, material para download, orientações e outras informações estão disponíveis no portal da Instituição. Os materiais disponibilizados podem ser utilizados em escolas e em outras instituições ou por profissionais que desejem falar sobre o tema.

O Coordenador do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude, Promotor de Justiça João Luiz de Carvalho Botega, afirma que o bullying deve ser combatido e que o diálogo a respeito do assunto deve ser amplamente difundido. Para ele, é preciso que os que sofrem bullying compreendam que existem pessoas interessadas em combater esse tipo de prática. “É importante que ele não sofra sozinho, que possa contar essa situação a alguém de confiança.”

O que é bullying e qual a sua origem?

O termo tem origem inglesa, na palavra bully (em português, “valentão”, “brigão”) e segundo o dicionário Michaelis significa um “ato agressivo sistemático, envolvendo ameaça, intimidação ou coesão, praticado contra alguém, por um indivíduo ou um grupo de pessoas”.

Apesar de a definição da palavra bullying estar em dicionários, livros e na internet, só quem sente, ou sentiu na pele sabe realmente o que ele significa e como pode trazer consequências para a sua vida. Baixa autoestima, depressão, isolamento, agressividade, fobias e falta de envolvimento com os colegas são alguns dos sinais que podem ser percebidos em vítimas do bullying.

Essas atitudes agressivas cometidas de forma repetitiva com o intuito de humilhar ou intimidar acontecem frequentemente na escola, mas podem ocorrer na vizinhança, nas redes sociais (cyberbullying), no trabalho e na família.

Orientadora educacional em uma escola pública de Florianópolis, Camila da Costa explica que a nossa sociedade cria valores, normas e padrões de comportamento, de corpo e de relações e que com frequência julga os que se diferenciam. “O bullying nasce a partir daí, quando vemos o outro (ou alguma de suas características) como inferior, como não merecedor do mesmo respeito e valorização que dedico a mim e a meus semelhantes.”

Colocar apelidos desrespeitosos, realizar comentários intolerantes, espalhar fofocas, fotos, ameaçar e agredir fisicamente são algumas atitudes consideradas bullying. “Me chamavam de ‘baleia’, ‘rolha’, ‘gorda’, ‘quatro-olhos’, mas isso era o de menos. Por mais que machucasse ouvir coisas assim, depois vieram as agressões físicas: chutavam minha lancheira, mochila, quebravam alguns materiais meus e um dia acabei apanhando de um grupo de meninas”, conta Mirela*, de 14 anos, que sofreu bullying durante cerca de cinco anos em uma escola de Florianópolis.

Há quem pratica, quem sofre e quem assiste

Além do agredido, existem outros envolvidos no ciclo de violência do bullying. Em regra, ele só existe porque há pessoas que assistem essa prática. “É bem importante que a pessoa que observa não estimule e nem fique em silêncio. Comunique a um adulto de confiança e procure ajudar aquela pessoa que está sofrendo bullying”, explica o Coordenador do CIJ.

Quanto ao agressor, é preciso levar em consideração que muitas vezes ele é uma pessoa que está em sofrimento e que também precisa ser apoiada ou ajudada. Frequentemente as violências praticadas têm origem em agressões sofridas em outros espaços, como na própria família. “É importante que não só a pessoa que pratica o bullying tome consciência dessa situação, mas também a escola e família, e que pais e professores colaborem nesse processo e acompanhem esse adolescente ou essa criança para verificar os motivos”, explica Botega.

Hoje adulto, Hugo* reflete sobre os anos que praticou bullying e sente-se arrependido. “Quando eu era criança eu sofria bullying e quando fui para o ensino médio, mudei de escola, decidi que ninguém mais praticaria bullying comigo. A maneira que encontrei foi praticar com os outros. Foi uma ‘defesa errada”, relata.

O combate

A orientadora educacional Camila explica que, na hora de combater os casos de bullying, é preciso ter cuidado para não esconder sua real origem, nem colocar todas as denúncias em um mesmo grupo de violência escolar, quando na verdade os casos podem ter história e contexto social diferentes. “Nosso trabalho, então, consiste em trabalhar com base no respeito e na valorização das pessoas, das diversas crenças e características de cada um”, complementa.

Sendo assim, cultivar a empatia e o respeito às diferenças, não estimular práticas preconceituosas, machistas, racistas, homofóbicas, entre outras, e participar da vida escolar da sua comunidade pode contribuir para a prevenção.

O bullying causa sofrimento e até mesmo mortes. Não é brincadeira e muitas vezes os resultados podem ser permanentes e ter impacto negativo na vida da pessoa, apesar de existirem histórias de superação. “Por conta disso tudo que passei acabei mudando a forma de tratar as pessoas. Tento ser a mais atenciosa possível, não tratar com grosseria nem indiferença porque não sabemos pelo que cada pessoa está passando, e eu sei como a indiferença pode machucar mais do que palavras”, conclui Mirela*.

* Todos os nomes foram substituídos para preservar a identidade dos entrevistados.

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