SANTA CATARINA – Rancho Queimado: liminar suspende decreto que inverteu ordem de prioridade e desconsiderou a lei estadual que estabelece a educação como atividade essencial
O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) obteve a suspensão do decreto do Município de Santo Amaro da Imperatriz que restringiu as aulas presenciais nas redes pública e privada de ensino em todos os níveis a partir desta quarta-feira (17/3), sem medida de mesmo teor em relação a atividades não essenciais. Assim, as aulas presenciais devem ser imediatamente retomadas em todas as escolas do ensino básico, públicas ou privadas, que tenham plano de contingência contra a covid-19 aprovado, garantido o direito de opção dos pais ou responsáveis para a manutenção da atividade remota caso não se sintam seguros quanto à proteção sanitária oferecida pela escola.
As decisões foram obtidas pelo MPSC nas ações ajuizadas após os municípios da Grande Florianópolis anunciarem a suspensão das aulas presenciais como medida de combate à pandemia, enquanto mantêm abertas atividades não essenciais, ainda que com restrição de horário.
Além de Rancho Queimado, também já foi concedida a liminar pleiteada em relação a Santo Amaro da Imperatriz, São Pedro de Alcântara, Angelina, Anitápolis, Águas Mornas, São José e Palhoça. As demais ações, contra os municípios de Florianópolis, Tijucas, Alfredo Wagner e São Bonifácio, aguardam decisão judicial.
Na ação da 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Santo Amaro da Imperatriz, assim como nas demais, o Ministério Público sustenta que, em um cenário de grave crise sanitária, o município pode legitimamente suspender as atividades educacionais presenciais. No entanto, a legalidade dessa medida deve ser avaliada no contexto mais amplo do combate à pandemia e vir, no mínimo, acompanhada de medidas restritivas idênticas ou mais rigorosas para todas as atividades não essenciais e não prioritárias.
No caso dos municípios da Grande Florianópolis, enquanto as aulas foram suspensas em todos os níveis, continua autorizado, ainda que com horário limitado, o funcionamento de todas as atividades comerciais não essenciais, como restaurantes, bares, academias, salões de beleza e barbearias.
O Ministério Público destaca que, desde 8 de dezembro de 2020, com a aprovação da Lei Estadual n. 18.032/2020, as atividades educacionais em Santa Catarina estão definidas como essenciais, e o atendimento presencial está limitado a um mínimo de 30% da capacidade.
“Constata-se a partir do decreto vindicado uma inversão de prioridades nas práticas sociais, das instituições e dos entes públicos, porque, enquanto outras atividades – não essenciais inclusive – estão liberadas por completo ou restritas apenas parcialmente (restrição de percentual de ocupação ou de horário de funcionamento), em tese com embasamento científico, há evidente descaso social com a educação, talvez a única cumpridora efetiva dos protocolos (acompanhados e fiscalizados em todo o território catarinense pelo Ministério Público)”, argumentam os Promotores de Justiça que assinam as ações.
Os Promotores de Justiça sustentam, ainda, que a escola é por excelência um espaço de promoção e de proteção de direitos, não apenas de fomento da educação formal. É no espaço escolar que a segurança nutricional e alimentar, a socialização, a convivência comunitária, o esporte e a cultura são concretizados. É na escola também que o trabalho infantil, a violência sexual, a violência psicológica, a violência física e a desnutrição são, na imensa maioria das vezes, identificadas e denunciadas.
“Nesse mesmo sentido, a relevância da escola como espaço de proteção para crianças e adolescentes que são vítimas de abusos e todas as formas de violência também se deve ao fato de que a maior parte dos abusos contra essa parcela da população ocorre justamente dentro de casa ou por pessoas próximas e de confiança da família”, completam. Além disso, o MPSC ressalta que as crianças e adolescentes estão sofrendo imposição por algo que não provocaram – elas não aprofundaram a crise sanitária, mas, sim, outras diversas atividades sociais e econômicas pouco fiscalizadas, responsáveis por parcela significativa da disseminação do vírus.
Assim, as ações buscam a suspensão liminar dos decretos com a posterior declaração de nulidade em sentença naquilo em que determina a suspensão das aulas presenciais no território municipal, em razão de ilegalidade e inconstitucionalidade, por violação da Lei Estadual n. 18.032/2020, que estabelece as atividades educacionais como essenciais no contexto do enfrentamento da pandemia de covid-19 em Santa Catarina, e do princípio da prioridade absoluta na garantia dos direitos da criança e do adolescente.